quarta-feira, 21 de novembro de 2012

Eu e minha mãe


Abro uma gaveta virtual e leio o que foi escrito em 2009.
A cena era a de um filho, já maduro, olhando fotos de um passado tão gostoso e tão inquieto.

Na foto, estava no seu colo. Curioso, tentava entender o botão de seu vestido.
Você me carregava, amparava. Mostrava para o mundo o que havia tornado seu novo centro. Não consigo me lembrar de seu cheiro. Lembro claramente da voz, do toque, do sorriso e da angústia.
Outra foto e outro carinho. Vila Sésamo, velas, bolo e palmas. Seu sorriso destaca mais que tudo. Quantos anos eu fazia? Quanto cuidado você tinha!
Mais uma? Ele tirando fotos e eu em cima do carro? No colo uma bola, parceira de sonhos e sonhos. Você pertinho. Parece tentar convencer de que seria mais seguro no do que sobre. Meu olhar desconversava. Olhar perdido como no dia da morte dos peixinhos. Como foi duro entender o infinito. Confesso que ainda não compreendo muito.
A próxima é linda! Cabeça baixa, tentava ficar de pé enquanto as ondas que batiam no tornozelo iam e vinham. Você, mão na minha perna, preocupada em ensinar a postura e o equilíbrio diante das diversas ondas que viriam. Vão e vem.
Sei que a ausência dele te matou aos poucos. Imagino que por seu rosto moreno ondas de lágrimas foram e voltaram. Até secarem.
O mundo te deu golpes. Você soube permanecer de pé. A casa diminuiu e a escola ficou longe. O carro encolheu e desapareceu.  Meu mundo infantil de bola, assovios, suor e feijão gostoso conheceu lugares diferentes. Viajamos, partimos, mudamos. Sei que eu era o empecilho e ao mesmo tempo o motivo. Nos seus braços adormecia e ao meu lado o branco tingiu seu cabelo.
Troquei muito cedo seus carinhos e risadas pelos arquivos e carimbos. Saía cedo e voltava tarde. De manhã o tergal azul escuro e à tarde o azul claro. Escola e trabalho. Depois, novela ao seu lado. Acobertava, dava abrigo, dava mão. Dividimos com oito a casa, que era oficina. O coração, sei, era só meu.
Nas linhas da palma de sua mão muitos caminhos e esquinas. Qual teria sido erro? Seu toque suave conduziu meu passo. Por aqui, por ali? O rumo nunca soube. Ensinou-me o caminhar.
Meu calendário virava rápido e percebi que o seu permanecia lá. Dias que foram meses até acreditar que poderia não rir de novo. Meses viraram anos sem coçar suas costas e espremer suas espinhas. Já não canto aquela música que alargava sua boca. Tenho muito pra dizer, preferia só te abraçar. Sei que foi melhor assim, sei que é pior assim.
Imagino quão coruja estaria agora. Queria devolver a alegria. Os dias têm sido curtos. Lá e cá estão bem próximos. Você não desgrudaria do chiado do rádio sempre mal sintonizado. Espalharia os horários e divulgaria a gargalhada por todas casas. Carrego no corpo seus traços e espalho os laços que nos uniram
São nove anos desde aquele dia. Nunca, nem um dia, deixei de pensar em você. Trago tudo na lembrança. Só não carrego seu cheiro.

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